30/10/2010

Nossa nova Oca é uma Aldeia

O caminho nos levou a chegar até o Arsenal da Esperança.



Em breve novidades, fotos e vídeos do nosso processo.

Sintonia Macunaímica...

21/10/2010

Dramaturgia improvisada do capítulo V da obra “Macunaíma”, de Mário de Andrade






Proposta de cena para improvisação. 
Contradição entre os discursos de formação da identidade nacional. (Macunaíma, Carta de Pero Vaz de Caminha, Iracema de Mario de Andrade) 



Macunaíma



O público aguarda o momento de entrada no universo cênico. Surge Macunaíma. Paletó, sem camisa, barriga saliente, discreta pintura indígena no rosto. Uma moringa de cachaça é tomada a todo momento, bebe aos golinhos. O que se apresenta é a figura de um bufão anfitrião

Macunaíma Senhoras e senhores, vagabundos e homens de bem, fracassados e diplomados. Sejam todos muito bem vindos. Lhes falarei de uma terra maravilhosa. Terra de Nosso Senhor (faz sinal da cruz), onde as aves falam, existe açúcar em abundancia; iguaria cujo sabor é mais doce que a doçura de vosso paladar encontra no mel.
A próxima Barca sai amanhã de manhã, aquele que desejar garantir sua vaga, basta não mostrar os documentos, comprovar sua ninguendade, ser filho de Zé ninguém com Maria desconhecida, ou proveniente de chocadeira. Não verificamos antecedentes criminais, não precisa ter experiência, referencia, registro em carteira, passaporte, visto, terço, patuá... É a barca da alegria, quem quiser é só chegar! Se quiser tirar a roupa fiquem a vontade (pausa) aqui é quente, Os Srs. sentiram calor. (adentram o espaço cênico, Macunaíma interrompe a caminhada ao avistarem no alto de uma escada, Pero Vaz de Caminha )


Pero Vaz de Caminha, pigarra, limpa a garganta, como um sujeito atrapalhado se preparando para um discurso importante, o faz até conquistar a atenção dos presentes. Desenrola o manuscrito da carta destinada a El Rei D. Manuel, escada a baixo. A mesma consiste em um rolo de papel higiênico

Pero Vaz de Caminha Majestade El Rei D. Manuel, sobre os habitantes de vossa terra nova; a feição deles é serem pardos, um tanto avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam nus, sem cobertura alguma. Nem fazem mais caso de encobrir ou deixar de encobrir suas vergonhas do que de mostrar a cara. Acerca disso são de grande inocência. Ambos traziam o beiço de baixo furado e metido nele um osso verdadeiro, de comprimento de uma mão travessa, e da grossura de um fuso de algodão, agudo na ponta como um furador. (surge uma mulher vestida de vermelho e salto com um cocar na cabeça) Outros traziam carapuças de penas amarelas; e outros, de
vermelhas; e outros de verdes. E uma daquelas moças era toda tingida de baixo a cima, daquela tintura e certo era tão bem feita e tão redonda, e sua vergonha tão graciosa que a muitas mulheres de nossa terra, vendo-lhe tais feições envergonhara, por não terem as suas como ela. Nenhum deles era fanado, mas todos assim como nós...


 enquanto a carta é lida, a mulher de vestido vermelho, baixa a manga do vestido, levanta a barra do vestido, expõe as pernas, sensual, puxa o zíper do vestido com delicadeza, deixa cair o vestido, surge não se sabe de onde um pano mais depressa que a nudez. O pano cai, podemos ver a Venus de Botticelli, mão sobre o púbis e seio; expressão de beleza apolínea. José de Alencar lê “Iracema”

José de Alencar - Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte, nasceu Iracema. Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna e mais longos que seu talhe de palmeira. O favo da jati não era doce como seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado. Mais rápida que a ema selvagem, a morena virgem corria o sertão e as matas do Ipu, onde campeava sua guerreira tribo da grande nação tabajara, o pé grácil e nu, mal roçando alisava apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as primeiras águas...

Macunaíma Chega de conversa fiada! Eu convidei o povo pra ouvir minha história; agora todo mundo vai querer aproveitar o palanque pra ser contador...

José de Alencar Fecha o Livro, pega Venus como se apanhasse uma escultura, carrega-a consigo para fora de cena. Macunaíma retoma

Macunaíma Agora eu. No fundo do mato-virgem nasceu Macunaíma, herói de nossa gente. Era preto retinto e filho do medo da noite. Houve um momento em que o silêncio foi tão grande escutando o murmurejo do Uraricoera, que a índia, tapanhumas pariu uma criança feia. Essa criança é que chamaram de Macunaíma.

a cena acontece


Denilson Oliveira



Por Maria Shu

CENA 1 - A Selva Amazônica
Os atores, valendo-se da técnica “band mime”, realizam, durante alguns breves instantes, sons típicos da mata (pássaros, vento, animais, etc).Vencido esse tempo, as atrizes permanecem na composição da floresta;  um ator apanha o tambor que marcará as micro cenas.
MANAAPE (marcando o chão) Oh, vamo abrir esse caminho aqui pra gente passar pra São Paulo!
Som de tambor no ritmo do caboclinho. Macunaíma pula nas costas do irmão Manaape.
MACUNAÍMA: Bora, Jiguê, bora pra São Paulo!Bora!
MANAAPE (reclamando) Tá pesado demais!
As atrizes deixam a formação arbórea e transformam-se em araras. Manaape caminha com Macunaíma no lombo no compasso do caboclinho. Jiguê  bate o tambor.
ARARA 1: Manaape!
ARARA 2: Manaape!
Os irmãos ignoram o chamamento das araras e continuam no cortejo.
ARARA 1: Manaape! Manaape!
MACUNAÍMA: O que estas araras estão falando aí?
ARARA 1:  Tô com fome, Manaape!
ARARA 2:  Quero comer… comer!
MACUNAÍMA: Dá alguma coisa pra elas comerem, Jiguê!
JIGUÊ: Ah, mas eu só tenho, agora, o cacau!
MANAAPE: Cacau é moeda de troca…como é que a gente vai se virar em São Paulo?
JIGUÊ (gritando)Vai, Macunaíma, faz alguma coisa!
Macunaíma sai das costas do irmão e segue em direção às aves reclamonas.
ARARA 2:  Dá cacau!
MACUNAÍMA:  Cês quer comer, é?
ARARA 1: Quer comer, Manaape!
Macunaíma lhes dá uma cusparada. As aves pulam ritmadas pelo tambor e saem voando possessas. Macunaíma ri da própria travessura.
ARARA 1:  Você vai se foder lá em São Paulo! Você vai se foder em São Paulo!
Jiguê volta a tocar o tambor no ritmo do caboclinho. Macunaíma reassume seu lugar nas costas de Manaape.
MACUNAÍMA: Bora!
CENA 2 –  O rio Tietê
As atrizes passam a interpretar o movimento das águas do Tietê. Segue o cortejo dos filhos da tribo tapanhumas.Todos tossem, incomodados com o mau cheiro do rio.
MANAAPE (tossindo) Oh., Macunaíma, você tá fedorento, hein?
Manaape expulsa o irmão de suas costas.
MACUNAÍMA (examinando-se) Não sou eu, não!
MANAAPE: Como é que a gente vai atravessar esse rio, aí?
MACUNAÍMA (para Jiguê) Pra frente, mano!
Jiguê, rolando o tambor, obedece.
MACUNAÍMA (para Jiguê) Tu vira agora canoa!
Macunaíma e Manaape tocam com um braço Jiguê e ele transforma-se na embarcação. Os três caminham juntos, enquanto Jiguê toca o tambor no ritmo do caboclinho. As águas continuam o seu movimento.
TODOS cantam (duas vezes)
Quem te ensinou a nadar?
 Quem te ensinou a nadar?
Foi, foi marinheiro
 Foi os peixinho do mar.
Os irmãos tossem algumas vezes durante o canto, desacostumados ao fedor do rio.
CENA 3:  São Paulo, a cidade macota
Agrupados, os atores realizam movimentos e sons repetitivos da metrópole.
ATOR 1: Carro
ATOR 2: Buzina (bi-bi)
ATOR 3: trem/metrô
ATRIZ 1: Relógio (tic-tac)
Atriz 2: Voz em off do metrô  (Estação Sé)
Os sons tornam-se mais altos e os movimentos mais rápidos, enchendo a cena até o ápice: o badalar da hora em ponto.
RELÓGIO: Blem…Blem!
CENA 4:  O Largo da Concórdia – Brás, SP
Há uma polifonia na cena, caos. Tudo acontece ao mesmo tempo.
ATOR 1: Olha o notebook!
ATOR 2: Pode entrar, freguesa!Dorinhos moda masculina!
ATRIZ 1: Deixa eu ler a sua mão! Eu leio a sua mãe.Deixa eu ler a sua  mão!
ATRIZ 2: Sufllair é um real, sufflair é um real!
CENA 5- As filhas da mandioca
Jiguê grita, interrompendo a pluralidade de vozes.
JIGUÊ (apontando para duas moças) Olha!
Os irmãos entreolham-se, satisfeitos com a visão. As moças riem  faceiras.
JIGUÊ, MANAAPE E MACUNAÍMA: Vamo brincar?
As mulheres, com risinhos e reboladinhas seduzem os irmãos, que passam a segui-las. O ritmo do tambor acompanha-os. A perseguição encerra-se marcada com uma forte batida no instrumento musical.
ELAS (debochadas) Não, não! Pra brincar (gesto sexual), tem que pagar!
MANAAPE: Pega o cacau e dá pra elas!
JIGUÊ: Cacau!
MACUNAÍMA: Cacau!
As moças gargalham, incrédulas.
MOÇA 1: Cacau, pra quê?
MOÇA 2: Suflair ali é um real.
Os irmãos estão confusos
MANAAPE: Mas tem que pagar com o quê?
MOÇA 1:  Dinheiro!
MOÇA 2:  Ali, na bolsa de valores!
MOÇA 1: Money!
MOÇA 2:  Tutu!
Jiguê, Manaape e Macunaíma, alvoroçados, encaminham-se à Bolsa de Valores, na tentativa de trocar cacau por dinheiro.
CENA 6-  Cacau por real
Macunaíma e os manos entram na casa de câmbio. As batidas no tambor marcam a mudança de uma atendente à outra.
MACUNAÍMA: Oi, a gente queria trocar cacau por dinheiro.
ATENDENTE 1: Dirija-se ao caixa número 2.
JIGUÊ: Oi, a gente queria trocar cacau por dinheiro.
ATENDENTE 2: Dirija-se ao caixa número 3.
MANAAPE: Oi, eu queria converter o cacau no dinheiro!
ATENDENTE 3:  O senhor tem a senha?
MANAAPE: Não!
ATENDENTE 3: Dirija-se ao caixa número 4.
MACUNAÍMA: Oi, eu queria transformar cacau em dinheiro!
ATENDENTE 4: Esta é a fila de idosos!
MANAAPE: Eu queria converter cacau no dinheiro!
ATENDENTE 4: Humm…humm…sem sistema!
Duas fortes batidas no tambor
MANAAPE, JIGUÊ E MACUNAÍMA (caindo, exaustos)Ai, que preguiça!
ATENDENTE 1: Vamos tomar um cafezinho?
ATENDENTE 2: Ai, não vejo a hora!
FIM







18/10/2010

Rascunhos

A proposta:
 
Vinte minutos para que os atores criassem, com as técnicas passadas no curso de Humor.
 
Conseguimos Brincar com o texto e apresentar para os amigos de sala.
 
Foi nosso primeiro rascunho.
Gustavo G Gonçalves


O resultado:





Quer ver mais? Acompanhe o nosso blog e acesse a página "Vídeos", em breve estarão disponíveis mais de nossos rascunhos e inspirações.

17/10/2010

Tupi or not tupi: This is the question

Brasil

O Zé Pereira chegou de caravela
E preguntou pro guarani da mata virgem
— Sois cristão?
— Não. Sou bravo, sou forte, sou filho da Morte
Teterê Tetê Quizá Quizá Quecê!
Lá longe a onça resmungava Uu! ua! uu!
O negro zonzo saído da fornalha
Tomou a palavra e respondeu
— Sim pela graça de Deus
Canhém Babá Canhém Babá Cum Cum!
E fizeram o Carnaval



Relógio

As coisas são
As coisas vêm
As coisas vão
As coisas
Vão e vêm
Não em vão
As horas
Vão e vêm
Não em vão

Erro de português
 
Quando o português chegou
Debaixo duma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena!Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O português


Oswald de Andrade

10/10/2010

“Macunaíma e o bufão brasileiro: o melhor da vida é isso e ócio!"


Mário de Andrade

Mário Raul de Moraes Andrade (São Paulo, 9 de outubro de 1893 — São Paulo, 25 de fevereiro de 1945) foi um poeta, romancista, crítico de arte, musicólogo, folclorista. Participou da Semana de Arte Moderna, em 1922. Escreveu “Macunaíma” em 1928.

Macunaíma


“Macunaíma”, obra e Mário de Andrade, narra as peripécias do anti-herói Macunaíma, índio nascido na tribo dos tapanhumas, em busca da muiraquitã, ao lado dos seus irmãos Jiguê e Manaape. É considerada rapsódia. Trata-se de uma obra experimental, que rompe moldes, desafia o leitor com uma nova proposta de texto. Macunaíma é a figura emblemática do Modernismo.

Bufão


Os Bufões eram seres disformes, que na Idade Média, serviam à classe dominante. A eles era permitido dizer aquilo que pensava, através de um humor ácido e negro, lhes era permitido criticar até seus “patrões”, os senhores feudais e mais tardes nobres.
De acordo com referenciais conhecidos, podemos afirmar que o bufão  é um personagem que figura a história medieval, o subversor das instituições e ritos de caráter sério. Para além das grandes representações que figuravam o calendário das cidades medievais, durante todo o ano a praça pública, as feiras e mercados eram tomados por palhaços, bobos, bufões, comediantes e demais artistas ambulantes. Mikhail Bakhtin nos diz que: 
(...) O mundo infinito das formas e manifestações do riso opunha-se à cultura oficial, ao tom sério, religioso e feudal da época. Dentro da sua diversidade, essas formas e manifestações – as festas públicas carnavalescas, os ritos e cultos cômicos especiais, os bufões, tolos, gigantes, anões e monstros, palhaços de diversos estilos e categorias, a literatura paródica, vasta e multiforme, etc. – possuem uma unidade de estilo e constituem partes e parcelas da cultura cômica popular, (...)1
No mundo medieval o teatro e o carnaval são expressões que muito se aproximam, e sua potencia de afetação é impar, opondo-se a todo o pensamento homogeinizador disseminado pela igreja, pelo estado feudal e pelas monarquias. 
     Os festejos populares onde aconteciam os ritos cômicos ocupavam um lugar muito importante na vida do homem medieval, festejos que enchiam as praças e as ruas por dias inteiros, possuíam sempre um aspecto popular e público. O riso acompanhava também as cerimônias e os ritos civis da vida cotidiana: assim, os bufões e os “bobos” assistiam sempre às funções do cerimonial sério, parodiando seus atos (...)2
O Bufão, dentro da pedagogia de Jacques Lecoq, compreende o universo das máscaras, uma máscara corporal, do senso crítico, pois esse personagem faz parte de um universo que subentende o imaginário e o intelectivo. A máscara do Bufão por sua vez, exercita o não realismo e traz à tona um artista crítico que questiona o mundo e a sociedade em que vive de uma maneira inteligente e cômica.
O grotesco, porém lúdico que envolve o universo macunaímico pode-se assimilar com processo de criação da bufonaria que é um estado onde o ridículo e a crítica do outros e até mesmo de si estão presentes. O exagero poético e a dilatação do imaginário que Mário de Andrade propõe em sua narrativa, podem se concretizar corporalmente nestes seres-personagem.

A obra de Mário de Andrade contempla tipos bufonescos: Jiguê, na força do homem, Manaape, velhinho, Macunaíma, o herói sem caráter. No texto de Mário de Andrade, o protagonista enquadra-se nas características do bufão, seja pelo seu comportamento antiético(deita-se com as cunhada, urina na mãe,  durante o sono, cuspia na cara dos machos, na infância…) seja pela relação que estabelece com o poder (Venceslau Pietro Pietra, o gigante Piamã). O bufão tinha uma aparência monstruosa, repulsiva. Encontramos essa referência logo no início da obra (“a índia tapanhumas pariu uma criança feia”); é uma figura deslocada do grupo, assim se vêem Macunaíma e seus irmãos  diante das máquinas em , São Paulo, uma sensação de não-pertencimento.

Podemos pensar que a obra de Mário de Andrade opera um pensamento paródico em relação à criação de um projeto de construir uma história do Brasil que empreendesse um tom sério, aos moldes das canônicas interpretações da história do mundo europeu, que ignora o riso, as manifestações populares e vida que acontece fora das instituições. Ousaríamos dizer que Mário territorializa esse tipo bufanesco  em terras brasileiras; bufão este que ri dos nossos valores, de nossa singularidade histórica circunscrita no modelo da cartilha européia. O bufanesco Macunaíma, herói sem nenhum caráter parte do interior da mata, no seio de uma tribo indígena, momento de nossa história que adquire dimensões míticas, repleta de figuras arquetípicas em direção a São Paulo, sinônimo de progresso, urbanização e cópia de modelos e valores europeus. Macunaíma conhece o cotidiano da “civilização”, as instituições que emanam valores morais e legisladores, ri de tudo e mantém sua característica bufanesca. Ri daqueles que ignoram a constante pulsão carnavalesca da nossa cultura, que produz uma constante sátira a hipócrita construção de uma sociedade progressista onde o progresso consiste em trabalho exaustivo a fim de produzir capital e bens de consuma, onde a alegria suprimida possa ser sanada por intermédio do derradeiro prazer incomensurável: “O consumo” de uma infinidade produtos que a força do trabalho produziu, o dinheiro intermediário dessa relação fecha o ciclo vicioso de trabalho e consumo. E como satirizaria Adoniram Barbosa: “O progresso vem do trabalho, então amanhã cedo nois vai trabalhar”. Muito provavelmente Macunaíma responderia: “Ai que preguiça”.